O corporate governance estabelece os direitos, deveres e funções de três grupos de intervenientes fundamentais das empresas: os sócios acionistas, a equipa de gestão e o Conselho de Administração, assim como define as premissas para o funcionamento eficaz das relações definidas na figura abaixo:
Nesta página, procura-se detalhar os principais pilares de um corporate governance robusto, tendo a Associação BRP e o IPCG identificado cinco principais pilares:
Adicionalmente, e no contexto das empresas familiares, o desafio da definição de boas práticas de corporate governance é ainda maior, pelo que dedicaremos um pilar extra a este tema:
Cada um dos cinco pilares será detalhado mais à frente neste Guia. Para além da caracterização do pilar, são elencados os princípios que lhes subjazem e um conjunto de ações claras alinhadas com as melhores práticas de corporate governance, e que recomendamos que sejam implementadas.
Existem vários níveis de complexidade e de exigência em cada um dos pilares de corporate governance. Estes níveis estão ligados ao nível de maturidade das empresas.
A maturidade das PME varia substancialmente entre as empresas e, consequentemente, também variam as suas necessidades de governance. Por este motivo, ao detalharmos os cinco pilares, damos também atenção a esta diferenciação.
Como referência, consideram-se quatro fases distintas de evolução empresarial:
A determinação das fases em que se encontram as PME não é determinística, nem dependente apenas de indicadores tradicionais, como a estrutura acionista/societária, o número de colaboradores, o volume de negócios ou a dispersão geográfica, mas prende-se, sobretudo, com a complexidade interna, nomeadamente ao nível organizacional e da tomada de decisão.
Em seguida são descritas as diferentes fases de evolução das PME tendo em conta os principais desafios a que estas estão expostas.
Apresentar-se-á a seguir cada um dos pilares estruturais identificados. Para cada um deles, serão detalhadas as seguintes dimensões:
1. CARACTERIZAÇÃO POR FASE DE MATURIDADE
Caracterização tendo em conta cada um dos quatro estados de evolução empresarial
2. PRINCÍPIOS A SEGUIR
Apresentação dos princípios chave que devem guiar as decisões tomadas em cada um dos pilares (e que orientaram as práticas recomendadas neste guia)
3. PRÁTICAS A IMPLEMENTAR
Recomendação do conjunto de práticas para cada um dos estados de evolução, sendo relevante notar que estas práticas são cumulativas à medida que se avança nos estados, devendo a empresa ser mais exigente consigo própria à medida que evoluiu
4. PERGUNTAS E RESPOSTAS
Apresentação de questões práticas para ajudar a compreender o que está a ser recomendado enquanto prática
No quadro seguinte é apresentada a caracterização dos órgãos de governo e processo de tomada de decisão das empresas tendo em conta a fase de evolução em que se encontram.
Existem um conjunto de princípios que devem reger a atuação das empresas, conforme o seu grau de maturidade, conforme referido anteriormente. Identificamos os mais relevantes.
Resumo das práticas recomendadas relativas aos órgãos de governo e processos
de tomada de decisão das empresas em função da fase de evolução:
* Entende-se por conselheiro externo o especialista dotado de experiência académica e/ou profissional relevante, que não sendo administrador da empresa, auxilia regularmente a mesma na determinação da sua estratégia.
Existem diversos órgãos de governo de uma empresa, alguns são de cariz obrigatório, i.e., a sua existência é imposta pela lei, outros têm carácter facultativo, cabendo às empresas a decisão de criar ou não esses órgãos. Independentemente da sua natureza obrigatória ou facultativa, os órgãos sociais têm todos eles um objetivo específico dentro da estrutura da empresa.
As empresas devem adotar estruturas decisórias claras e transparentes, de modo a assegurar uma maior eficiência do funcionamento dos órgãos e das suas comissões, mas também maior facilidade na transmissão da informação entre os diversos órgãos sociais, para que todos eles atuem de forma harmoniosa, articulada e comprometida com os mesmos objetivos e fins.
Apresentamos, de forma não exaustiva, os principais órgãos e respetivos objetivos:
Órgão composto pelos sócios/acionistas, que funciona como fórum de encontro entre os corpos gerentes/Conselho de Administração e os sócios/acionistas da empresa para avaliar a performance e discutirem a estratégia da empresa.
As assembleias gerais possibilitam a participação efetiva dos sócios/acionistas na vida da sociedade, com debate de ideias, trocas de informação, apresentação de propostas e contrapropostas.
O envolvimento dos sócios/acionistas no governo societário é um importante instrumento para o funcionamento eficiente da sociedade e para a realização do seu fim social.
Todas as empresas têm órgão de administração ou gerência, ainda que este possa ser um órgão singular (i.e., composto por uma só pessoa como um administradordelegado, por exemplo). O órgão de administração ou gerência tem a seu cargo a gestão dos negócios e a representação da sociedade.
Os atos de gestão da sociedade incluem, entre outros, as decisões estratégicas ou fundamentais sobre os objetivos empresariais a longo prazo, a organização dos meios produtivos, dimensão e localização das empresas, as várias políticas empresariais – produção, distribuição, pessoal, financiamento, etc.
A partir de uma determinada dimensão e maturidade organizacional o modelo mais habitual é o de existir um Conselho de Administração com membros executivos (equipa de gestão) e não executivos, e que tem como missão, por um lado, a aprovação da estratégia e principais políticas da empresa e, por outro, o acompanhamento e supervisão da equipa de gestão executiva, assegurando que concretiza a estratégia e as políticas aprovadas.
Órgão que tem como objetivo a execução da estratégia aprovada para a empresa pelo Conselho de Administração. É responsável pela gestão operacional da empresa e por disponibilizar ao Conselho de Administração a informação necessária para acompanhar a concretização das decisões tomadas por este órgão e, de um modo mais geral, o desempenho da empresa.
Deverão ter um elevado grau de independência face aos Órgãos de Gestão, de modo a poderem executar a sua função de fiscalização de forma permanente e completa, sem qualquer enviesamento que possa ser prejudicial aos melhores interesses da empresa.
São considerados órgãos de fiscalização, o conselho fiscal ou fiscal único, na sociedade por quotas; o conselho fiscal ou fiscal único, a comissão de auditoria e o conselho geral e de supervisão, na sociedade anónima, consoante o modelo de governo adotado.
Adicionalmente, as empresas podem constituir comissões especializadas para acompanharem em maior detalhe temas de grande relevância para a empresa e que beneficiam de um acompanhamento maioritariamente realizado por administradores não executivos ou conselheiros externos e à margem da influência direta da gestão executiva.
Como exemplos, refiram-se as Comissões de Auditoria, de Remunerações e de Ética.
Antes de estabelecer um Conselho de Administração com administradores não executivos há empresas que criam no seu seio um conselho estratégico ou conselho consultivo.
As empresas podem ter o referido Conselho Consultivo, devendo a possibilidade de constituição deste órgão estar prevista nos estatutos e desde que ascompetências que lhe sejam atribuídas não colidam com a dos órgãos que resultam obrigatoriamente da lei.
O Conselho Consultivo, ao contrário do Conselho de Administração, não tem poder formal de decisão; no entanto, apoia a equipa de gestão oferecendo uma visão externa à empresa, geralmente independente e com conhecimento e experiência detalhados em diversas áreas, que pode constituir um auxiliar precioso a quem tem a responsabilidade pela gestão da empresa.
Em termos do bom funcionamento do Conselho de Administração, deve ser adotado um conjunto de procedimentos que garanta que o mesmo é bemsucedido na missão que lhe é confiada. Sublinhe-se, neste domínio e de forma não exaustiva:
Não existe um número de membros ideal pré-definido: a composição do Conselho de Administração deverá variar consoante a dimensão e a complexidade de cada empresa. No entanto, é aconselhável que este seja integrado por um ou mais gestores profissionais que não sejam detentores de capital num montante que permita o controlo da empresa.
O mais usual é o Conselho de Administração ter um número de membros ímpar e ser composto por entre 5 e 10 elementos, podendo integrar administradores executivos e não executivos. Dentro da categoria de administradores não executivos, estes podem ser não independentes ou independentes.
Os administradores executivos têm funções de gestão na empresa, por sua vez, os administradores não executivos não têm poderes de gestão corrente da sociedade. No essencial, e em relação à gestão executiva, assumem três funções distintas:
De uma forma geral, os administradores executivos compõem a designada comissão executiva em quem o Conselho de Administração efetua uma delegação de poderes que define os limites da autonomia da gestão executiva, como se analisará mais à frente. No seu formato mais habitual, a comissão executiva é composta por um número entre 3 e 5 elementos.
Os administradores independentes devem ter total liberdade/imparcialidade de decisão, precisamente por não terem especiais relações com a sociedade, com os acionistas ou os outros membros executivos. Os administradores não executivos não independentes são, geralmente, representantes de acionistas relevantes (daí não serem independentes).
Apesar dessa ligação, que naturalmente condiciona a sua imparcialidade em termos dos interesses da generalidade dos stakeholders, não significa que não sejam pessoas qualificadas ou que não possam aportar o seu conhecimento e experiência ao bom desempenho da gestão executiva.
Os membros executivos, pela sua condição, nunca são classificados como administradores independentes.
Relativamente ao perfil dos membros do Conselho de Administração é fundamental que exista, ao nível da gestão executiva um conhecimento detalhado do negócio e dos mercados em que a empresa opera, bem como um efetivo domínio das principais áreas funcionais (finanças, compras, operações, comercial, marketing, etc).
Relativamente aos membros não executivos, para além de ser relevante a existência de conhecimento do negócio, é também importante conseguir uma razoável diversidade (nas características pessoais, na formação académica e na experiência profissional), de modo a enriquecer a qualidade da análise e o debate no Conselho de Administração contribuindo para uma melhor tomada de decisão
A decisão de incluir administradores independentes no Conselho de Administração é um passo muito relevante na evolução da estrutura de governance de uma empresa, pela sua complexidade, mas acima de tudo pelo que representa em termos de ganho ao nível da solidez das estruturas governativas.
É, no entanto, um passo que é muitas vezes adiado pelos sócios pela necessidade de envolver na gestão da empresa pessoas que lhe são externas e sobre as quais os sócios não têm qualquer controlo.
A nomeação de administradores independentes tem várias vantagens:
Existem também potenciais impactos negativos que se devem ter em conta, de modo a preveni-los, e se centram num envolvimento e participação inferior ao desejável, muitas vezes fruto de uma menor disponibilidade decorrente da assunção de vários compromissos profissionais.
A nomeação de administradores independentes é também uma excelente forma de proteger os interesses dos acionistas minoritários, nomeadamente em relação aos interesses dos maioritários.
O processo de seleção depende da tipologia de administrador. No caso de administradores representantes de acionistas, o processo deve ser gerido pelos acionistas envolvidos e aprovado pela Assembleia Geral se estiverem em sua representação como não executivos, ou pelo Conselho de Administração, com aprovação da Assembleia, caso queiram incluir no Conselho de Administração membros das equipas executivas.
É muito importante que os administradores tenham um perfil alinhado com a cultura da empresa e, por isso, todas as nomeações, mesmo as feitas pelos acionistas, beneficiam de serem feitas de forma concertada. Em particular avultam os administradores executivos que deverão assegurar a formação de uma equipa profissional, coesa e multidisciplinar, com as valências de conhecimento e experiência que assegurem uma efetiva resposta aos desafios que a empresa tem pela frente.
No caso de administradores independentes, a sua seleção deve ser feita, preferencialmente, por uma entidade externa à empresa (executive search), potenciando o profissionalismo do processo de seleção e a independência do administrador selecionado.
Por outro lado, é importante que haja uma visão de portfolio sobre o conjunto do Conselho de Administração, de modo a maximizar a sua diversidade e assegurar que dispõem do conhecimento e experiência mais crítica para o negócio que a empresa desenvolve.
Para além da importância do processo de seleção, é também muito relevante o subsequente programa de indução de cada novo administrador.
O objetivo é o de, através de um programa estruturado de apresentações, reuniões e visitas, familiarizar o mais rapidamente possível o novo administrador com a realidade da empresa, de modo a mais rapidamente poder contribuir, com maior conhecimento, no processo de decisão da empresa.
Por fim, é muito recomendável a realização de uma avaliação contínua do desempenho do Conselho de Administração, e dos seus membros, no primeiro caso procurando assegurar que a sua estrutura, composição e modo de funcionamento é o que melhor se adequa às necessidades e objetivos da empresa e, no segundo caso, que cada membro continue a aportar, de modo regular e consistente valor acrescentado ao processo de decisão do Conselho de Administração.
É importante garantir que existem condições para o Conselho de Administração cumprir as suas funções, principalmente assegurando que lhe é fornecida toda a informação necessária de forma estruturada e atempada. Para isso, deve ser assegurado um fluxo de informação regular entre os diversos órgãos sociais da empresa e, em particular, entre a gestão executiva e o Conselho de Administração.
A principal função de um Conselho de Administração é promover o sucesso e a sustentabilidade a longo prazo da empresa, seja através da definição e aprovação da estratégia da empresa, seja acompanhando e monitorizando a qualidade da sua execução. Neste âmbito avulta a delegação de competências que o Conselho de Administração efetua na gestão executiva e na qual define os limites da sua autonomia.
Deve ser responsabilidade do Conselho de Administração, a discussão e aprovação, por proposta da gestão executiva, de ações concretas e relevantes que efetivem a estratégia definida, nomeadamente ao nível da aprovação do plano de negócio e dos orçamentos anuais, das políticas financeira, de gestão de riscos e de recursos humanos, entre outras, e de concretização de operações de financiamento, de M&A ou de entrada em novos setores/ mercados.
Para além da definição das funções ao nível de cada órgão, é também relevante a definição de responsabilidades ao nível das funções individuais mais relevantes, nomeadamente as do presidente do Conselho de Administração (Chairman) e do presidente da comissão executiva (Chief Executive Officer - CEO).
O surgimento de conflitos severos entre sócios/acionistas é algo que por vezes acontece nas empresas, na grande maioria dos casos por divergências sobre a visão e estratégia a prosseguir.
Estes tipos de conflitos podem levar à quase paralisação das empresas, se não forem bem geridos. As práticas de governance deverão ter um papel predominante na sua prevenção e resolução. Uma das formas mais simples de solucionar ou prevenir este tipo de conflitos é a definição prévia de regras e instâncias para a resolução de situações de conflito entre sócios, como por exemplo: mecanismos de arbitragem e critérios de decisão, responsabilidades de cada sócio/acionista nos diferentes tópicos, direitos de saída, etc.
Outra das formas de prevenir conflitos é partilhar e incentivar um conjunto de melhores práticas que sejam identificadas, como por exemplo o papel dos regimes de bens no casamento e a sua implicação sobre a sociedade no momento de um divórcio, ou o estabelecimento de um protocolo familiar sólido, quando se tratar de uma empresa de cariz familiar.
Caracterização das práticas de gestão de risco e controlo interno das empresas
por fase de evolução:
Resumo das práticas recomendadas relativas aos órgãos de governo
e processos de tomada de decisão das empresas em função da fase de evolução:
Um sistema de gestão e controlo de riscos assenta em três componentes: o Controlo Interno, a Auditoria Interna e a Auditoria Externa.
Numa primeira instância, o controlo e gestão de risco deverá focar-se em assegurar que toda a informação financeira-contabilística é correta e traduz o real desempenho da empresa.
Esta informação é fundamental para a gestão do negócio. É também fundamental para a credibilidade da empresa, uma vez que grande parte das avaliações de risco de crédito e financiamento por parte de terceiros (bancos, fornecedores, clientes) se baseiam nesta informação.
A separação do património entre a empresa e seu dono, assim como a transparência das regras contabilísticas utlizadas, são boas práticas que deverão ser seguidas desde o primeiro dia.
Independentemente do setor, geografia e contexto, existem três riscos a que todas as empresas deverão prestar particular atenção, pois são bastante comuns e os seus impactos podem ser elevados:
O controlo da gestão de tesouraria procura antecipar eventuais problemas de liquidez. No que respeita aos sistemas de informação, o controlo interno deverá procurar garantir que os sistemas estão operacionais, atualizados e que respondem às necessidades do negócio, que a informação é consistente entre sistemas (particularmente relevante em contextos em que os sistemas não comunicam entre si ou essa comunicação não é feita em tempo real) e que são robustos contra falhas/inoperatividade e possíveis ataques externos. É também fundamental garantir o cumprimento de toda a regulamentação em termos de proteção de dados (RGPD). A ética e conduta dos colaboradores é fundamental para garantir que a empresa não incumpre qualquer regra legal e regulatória.
Adicionalmente, o controlo interno deverá focar-se em todos os outros riscos materialmente relevantes para o negócio e que estão intimamente relacionados com o contexto, setor e geografia da empresa em questão.
Existe uma infinidade de riscos não só financeiros, mas também operacionais, estratégicos e regulatórios, cobrindo áreas desde a saúde e segurança, recursos humanos, operações, ambiente, tecnologias de informação e reputação.
A gestão de risco é uma função que deverá estar disseminada em toda a organização, contudo caberá à equipa de gestão assegurar os meios operacionais, e ao Conselho de Administração e ao órgão de supervisão/fiscalização, caso este exista, enquanto órgãos fiscalizadores do funcionamento da gestão de risco, garantir a qualidade da mesma.
A operacionalização do controlo interno deverá iniciar-se por uma discussão, entre membros da equipa de gestão, do Conselho de Administração e outros colaboradores com visão alargada do negócio, com vista a identificação de quais são os riscos materiais para o negócio.
A discussão deverá passar pela identificação do risco, a sua quantificação, e definição do apetite/limites de tolerância ao mesmo por parte da empresa, tendo em conta a sua missão, valores, objetivos e estratégia. Este exercício de Avaliação de Riscos deverá ser uma prática da empresa que periodicamente (por exemplo, anualmente) deverá ser revisitada.
Uma vez identificados estes riscos, caberá à gestão assegurar que:
A gestão é responsável por assegurar que estes procedimentos de controlo são desenhados, por ela aprovados e comunicados na organização (por exemplo, as equipas comerciais/de relação com cliente deverão ter conhecimento dos procedimentos), incluindo estarem perfeitamente identificados os responsáveis pelas diferentes atividades de controlo implementadas.
A gestão e controlo de risco apenas é eficaz quando toda a organização está envolvida. Apenas funciona quando todos os colaboradores estão familiarizados com os principais riscos a que a empresa está exposta e entendem o grau de tolerância que esta tem aos mesmos, e quando são incentivados a identificarem e a denunciarem situações anómalas ou de acréscimo de risco.
Existem diversos mecanismos que promovem este envolvimento da organização. A título de exemplo:
O código de ética e conduta é um documento interno da empresa que sistematiza as regras e os princípios de comportamento a adotar pelos colaboradores da empresa, de forma a garantir que estes estão em linha com os seus valores.
Deverá, por isso, ser tornado público.
Naturalmente, o código deve indicar a necessidade de cumprimento dos normativos legais e regulatórios em qualquer atividade da empresa, mas deverá ir mais além, dedicando uma parte substancial a detalhar a relação esperada da empresa com os seus diferentes stakeholders.
As principais áreas temáticas cobertas nos códigos de conduta são:
O documento também deverá indicar qual o comportamento esperado em caso de observação de não adesão ao código, bem como as consequências associadas.
O código de ética e conduta deverá ser aprovado pelo Conselho de Administração, mas é um documento vivo, que deve revisitado e ajustado conforme a evolução do negócio, do mercado e da envolvente em que a empresa atua.
Para além do cumprimento legal (por exemplo, desde agosto de 2017 que as empresas com sete ou mais colaboradores, em Portugal, são obrigadas a elaborar e a publicar internamente um código de conduta para a prevenção e combate ao assédio no trabalho), não existem normas claras de quando cobrir determinada temática no código de conduta.
O código de conduta deverá ser interpretado como uma ferramenta eficaz de comunicação e alinhamento de práticas internas, bem como um instrumento que contribui fortemente para a criação da imagem e reputação da empresa.
Uma boa prática poderá ser, no momento em que a gestão e o Conselho de Administração fazem uma avaliação da materialidade dos diferentes riscos a que a empresa está exposta (anual/ outra periodicidade), avaliar também se e como esses riscos deverão estar endereçados no código de conduta.
Em todas as empresas existem ocasiões em que os colaboradores poderão deparar-se com situações em que os seus interesses individuais poderão entrar em conflito com os interesses da empresa (por exemplo, na decisão de venda a crédito a um familiar ou amigo, sabendo que a empresa não o financiaria tendo em conta as suas dificuldades financeiras).
Uma boa prática das empresas passa por desenhar uma política para guiar os decisores (diretores, gestores e outros colaboradores, nomeadamente equipas de compras) em situações de (potencial) conflito de interesse. Esta política deverá explicitar o que é considerado conflito de interesses (relação com partes relacionadas; outra atividade profissional, interesses familiares e ofertas), como devem ser prevenidas situações de potencial conflito de interesses e como atuar perante tal situação, caso esta venha a acontecer.
Será uma boa prática refletir esta política no código de conduta ou ética da empresa, de modo a que todos os colaboradores, independentemente da posição que ocupam, tenham uma visão clara sobre o tema.
O principal requisito para os membros da equipa de auditoria interna é a sua independência, para além das necessárias competências técnicas específicas. Estes elementos não poderão, em qualquer situação, sentir que estão em situação de conflito de interesses.
É fundamental para isso que estes elementos não estejam, nem tenham estado, pelo menos num passado recente, envolvidos com as operações que serão auditadas.
No contexto de empresas mais pequenas, a auditoria interna poderá reportar à gestão; contudo, em última instância, a auditoria interna está a avaliar as práticas de gestão e de controlo interno que são da responsabilidade da gestão, pelo que, para assegurar a não existência de conflitos de interesse, esta função deverá reportar hierarquicamente, ao Conselho de Administração caso exista este órgão integrando no seu seio a equipa executiva.
Num estádio mais avançado de governo societário esse reporte hierárquico deve ser feito ao órgão de fiscalização (Conselho Fiscal ou Comissão de Auditoria).
Como mencionado, a gestão de risco deve ser assumida como prioridade pelo Conselho de Administração e, subsequentemente, pela gestão executiva da empresa.
O Conselho de Administração define a estratégia e os objetivos de gestão e risco, a equipa de gestão traduz a mesma em políticas e processos eficazes, implementando-os e garantindo consistência com o nível de tolerância ao risco definido pelo Conselho de Administração.
Empresas de maior dimensão e complexidade, nomeadamente empresas na fase de maturidade empresarial (fase 4), estão expostas a múltiplos riscos, pelo que poderá não existir suficiente disponibilidade no âmbito das atividades do Conselho de Administração para a análise regular e detalhada dos riscos.
Torna-se por isso recomendável que alguns membros do Conselho de Administração (preferencialmente os não executivos), constituam uma comissão dedicada aos riscos.
Essa comissão tem como missão acompanhar mais de perto os riscos a que a empresa está exposta e assegurar que o controlo destes riscos está em linha com o definido no Conselho de Administração.
A comissão poderá ter alguns poderes delegados, numa lógica de adesão a uma função vocacionada para imprimir maior eficácia e eficiência na gestão das responsabilidades do Conselho de Administração.
Caracterização das práticas de transparência e reporting das empresas por fase
de evolução:
Resumo das práticas de transparência e reporting a adotar (cumulativamente)
pelas empresas em função da fase de evolução:
As empresas devem ter processos internos e rotinas de preparação de reportes de informação recorrentes. Estes devem ser preparados pelos órgãos de gestão e disponibilizados aos órgãos de fiscalização, e outros stakeholders relevantes, com o detalhe suficiente para que possam acompanhar a evolução da performance da empresa e emitir sobre a mesma os pareceres que lhes competem.
Deve ainda ser disponibilizada informação a alguns stakeholders específicos, como colaboradores e banca, de forma a aumentar a confiança na gestão e governação da empresa.
Adicionalmente, a empresa deve proactivamente disponibilizar publicamente, no seu website por exemplo, um conjunto de informação que, apesar de mais limitado por razões concorrenciais ou de confidencialidade, permita aos restantes stakeholders compreender a sua evolução, seja a título financeiro ou de sustentabilidade.
As empresas devem preparar informação completa, mas ajustá-la aos seus destinatários, órgãos de gestão e de fiscalização, stakeholders internos e externos, e público em geral.
A informação financeira e operacional, completa e detalhada, deve permitir aos seus utilizadores aferir a evolução e avaliar os resultados e riscos a que a empresa está exposta. Alguns exemplos são os relatórios de acompanhamento da atividade mensal, com informação operacional, desempenho financeiro e fluxos de caixa. A informação financeira deve incidir sobre peças standard que são reconhecidas pelos mercados e pelos stakeholders, nomeadamente contas de exploração que permitam demonstrar os resultados financeiros da empresa, balanço que reflita a situação patrimonial da empresa e fluxos de caixa que demonstrem a capacidade financeira da empresa.
Ao nível operacional, e predominantemente utilizados internamente (pela gestão executiva e Conselho de Administração), devem ser desenvolvidos reportes com os indicadores mais relevantes, que possibilitem o acompanhamento detalhado do comportamento das diferentes unidades de negócio da empresa, a sua performance nos diferentes mercados e das suas unidades de produção.
A informação não financeira com evolução de indicadores ambientais, sociais e de governance deve também ser preparada e acompanhada de forma regular.
Estas informações devem ser partilhadas proactivamente ou disponibilizadas publicamente, por exemplo, no sítio da internet da empresa, e mantidas o mais atualizadas possível.
A granularidade deve ser ajustada aos destinatários. Enquanto para o público e outros stakeholders externos, esta deve ser mais genérica e menos densa, no caso dos stakeholders internos, incluindo os órgãos de gestão e de fiscalização, deve ser completa, sem ser excessiva.
Em termos de formato propriamente dito, e para além dos legalmente exigidos, como as demonstrações financeiras, a empresa deve preparar relatórios para os diversos órgãos sociais que permitam acompanhar a evolução da performance operacional, financeira e ESG da empresa.
A informação operacional e financeira para partilha interna deve ter, pelo menos, numa frequência mensal, sendo que a informação para partilha com stakeholders externos deverá ser, no mínimo, trimestral.
Sim, para além do contacto com entidades externas as empresas devem também criar canais de contacto para que estas possam solicitar informações adicionais, como por exemplo os gabinetes de provedoria ou de relação com investidores (para empresas cotadas).
A cultura de transparência terá de partir desde logo dos sócios. Estes devem assumir uma postura clara sobre a estratégia e objetivos no contacto e nas exigências/ desafios à equipa de gestão. As relações entre sócios/ acionistas, equipa de gestão e outras entidades devem ser conhecidas e reportadas.
Caracterização da cultura empresarial e compromisso com o governance
das empresas por fase de evolução:
Resumo da cultura empresarial e compromisso com o governance a adotar
(cumulativamente) pelas empresas em função da fase de evolução:
A criação de uma cultura empresarial de governance decorre, sobretudo, da atitude dos seus sócios/acionistas e da relevância que estes dão ao tema.
Existem alguns procedimentos básicos que decorrem da lei aplicável, no entanto estes não são por si só suficientes para garantir um governance robusto e eficaz. Cabe, portanto, aos sócios/acionistas, sobretudo aos fundadores, terem no seu radar o tema do governance e puxarem pelo mesmo desde a génese das suas empresas.
Para além da cultura empresarial, o estabelecimento de uma estrutura organizacional com segregação de funções e de responsabilidades é também um forte aliado do bom governance.
O papel dos sócios/acionistas deve ser ajustado à medida que a empresa cresce, ganha dimensão e se complexifica. Se inicialmente o papel do fundador se confunde com a empresa, porque ele é responsável por todas as decisões operacionais, à medida que a empresa cresce, se expande e consolida, ele deve passar a assumir um papel de estratega e o seu foco deverá estar no longo prazo.
Para tal, deve fomentar a profissionalização da gestão e a adoção de mecanismos de governance que garantam o cumprimento das melhores práticas, no sentido de melhor promoverem a sustentabilidade a longo prazo da empresa e não só de cumprir o legalmente exigido, mas também consolidarem a reputação da empresa, e consequentemente, dos seus sócios/acionistas.
Em termos formais, sim, serão estes o último garante de que a empresa adota boas práticas de governance. É à assembleia de sócios/acionistas que cabe definir (nos estatutos e na eleição dos órgãos sociais) a configuração essencial do modelo de governance que se pretende adotar.
Num estádio de desenvolvimento mais avançado da empresa competirá ao Conselho de Administração (eleito pelos acionistas) fazer evoluir e supervisionar o modelo e as práticas de governance adotadas.
Nesta fase adquire especial importância a figura do secretário da sociedade que assume a função do profissional interno que zela pelo bom cumprimento da estrutura e das práticas de governance aprovadas.
Não, a estrutura organizacional adequada a uma empresa e que garanta um governance robusto dependerá sempre do seu estágio de maturidade em cada momento.
Inicialmente, esta caracterizar-se-á por ser uma estrutura simples e centralizada, mas que deverá evoluir para uma estrutura descentralizada e mais complexa com funções, responsabilidades, autoridade e hierarquias bem definidas, quer em termos de gestão quer de cumprimento das exigências de governance.
Tal como na estrutura organizacional, também as políticas e procedimentos devem ser ajustados ao momento específico de cada empresa. Não obstante, os procedimentos devem evoluir de forma a, inicialmente, apoiarem a atividade de equipas com natureza centralizada e multidisciplinar, mas posteriormente, fomentarem a cooperação entre equipas com funções bem definidas e especializadas, responsabilidades específicas atribuídas e conhecimentos detalhados nas suas áreas de atuação.
Devem ser criadas regras de funcionamento e de comunicação dentro das empresas, consagradas nos seus estatutos, nos regulamentos dos órgãos sociais, em eventuais códigos de ética e de conduta, que assegurem elevados padrões éticos, formação nestes mesmos códigos e procedimentos que relevem a importância do governance, segregação de funções e responsabilidades cruzadas que fomentem o controlo interno.
É para isso que desenvolvemos este guia, para que qualquer PME, dependendo do seu estágio de desenvolvimento e da sua complexidade organizacional e operacional, possa encontrar respostas que lhe permitam adotar as melhores práticas de governance, evitando que estas pequem por defeito, colocando em risco a sua reputação, ou por excesso, implicando um peso burocrático excessivo.
Caberá sempre aos sócios/acionistas, preferencialmente com o apoio dos órgãos de gestão e o envolvimento dos seus colaboradores e stakeholders mais próximos, avaliar como deve evoluir a sua estrutura organizacional e de governance.
Em empresas mais complexas, deve ser criado um calendário e um plano de ações com iniciativas, timings e responsáveis que permita o acompanhamento contínuo destes temas.
Em empresas familiares, a temática do governance é ainda de maior importância e criticidade, uma vez que ao governance da empresa se adiciona o governance da família, e a relação desta com a empresa. A complexidade deste pilar é substancial e o que aqui é desenvolvido representa apenas uma pequena parte dessa complexidade, recomendando-se, a este respeito, a leitura de alguma da vasta literatura existente sobre o governance em empresas familiares.
Caracterização do corporate governance em empresas de cariz familiar por fase
de evolução:
Resumo da cultura empresarial e compromisso com o governance a adotar
(cumulativamente) pelas empresas em função da fase de evolução:
Estima-se que as empresas familiares representem cerca de 70% do total de empresas existentes em Portugal. Adicionalmente, as estatísticas existentes dizem-nos que a cada passagem geracional, apenas 30% das empresas tendem a sobreviver. Juntando estas duas informações, torna-se clara a relevância e criticidade que a preparação da sucessão, através de um plano estruturado, tem para as empresas familiares e, consequentemente, para a economia portuguesa.
Os diferentes membros da família podem assumir diferentes papéis dentro da empresa: podem ser sócios/acionistas, colaboradores da empresa ou membros do seu Conselho de Administração, podendo cumular, ou não, as duas qualidades de proprietários e colaboradores ou gestores. Nenhum destes papéis é melhor do que o outro. O que é relevante é garantir que a escolha é feita de acordo com o melhor interesse da empresa.
O plano de sucessão mais relevante é sem dúvida o da sucessão familiar, mas é importante ter também em consideração o plano de sucessão da equipa de gestão e de pessoas chave na empresa. Estes planos devem ser alinhados com a estratégia e os objetivos definidos para a empresa – adequando as pessoas às necessidades da empresa. Será importante ponderar e planear, no contexto concreto da cada família e empresa, se é desejável que a propriedade da família se mantenha, de forma mais ou menos maioritária, nas mãos da família, ou se, pelo contrário, é vantajoso abrir o capital a investidores, bem como em que momentos tal abertura deverá ser realizada.
De igual forma, é importante determinar e regular, ao nível da equipa de gestão,qual a composição pretendida entre membros da família e gestores profissionais.Por um lado, a vantagem de incluir gestores profissionais é evidente e o caminho mais natural para uma empresa em crescimento. Por outro lado, membros do Conselho de Administração ligados à família poderão ajudar a contribuir para o estabelecimento e cumprimento de objetivos de longo prazo, ligados ao desiderato da família e da empresa, bem como ao reinvestimento na organização.
Em acréscimo, a coexistência de membros da família com papéis diferentes (uns apenas sócios/acionistas, outros com responsabilidades de gestão), pode realçar problemas de agência e, por isso, criar a necessidade de regular o reporte interno e o exercício de direitos de informação aos membros da família menos ligados à gestão, tendo em vista uma sucessão pacífica.
Finalmente, no contexto da sucessão familiar, será necessário ter em conta as vicissitudes específicas das pessoas singulares. A morte de um sócio-gerente, por exemplo, ou o divórcio de um acionista, podem ter impacto na titularidade e gestão da empresa. Essas situações têm um impacto não negligenciável nos conflitos e na paralisação da gestão das empresas familiares, sendo, por esse motivo, também importante planear a sucessão.
Poderá haver uma abordagem mais proativa por parte dos sócios/acionistas na preparação de um ou mais potenciais sucessores, de forma atempada – seja no conhecimento do negócio, seja no desenvolvimento de capacidades de gestão; ou uma abordagem mais reativa, observando os vários membros das gerações mais novas a movimentarem-se e a declararem o seu interesse ou não em manterem a sua ligação profissional à empresa.
A primeira abordagem é claramente mais prudente e eficaz, no entanto a segunda permite que a liderança da empresa não seja algo imposto, mas sim natural, promovendo até o aparecimento de outras soluções potencialmente melhores, como por exemplo, a contratação de um gestor profissional para suceder ao membro da família acionista, ou mesmo a venda ou dispersão em bolsa, de parte ou da totalidade, do capital da empresa.
Dependendo do perfil de gestão pretendido, será natural que uma empresa familiar nos estágios mais avançados de desenvolvimento exija certos requisitos para a ocupação de cargos no Conselho de Administração, como certas qualificações profissionais, experiência no setor de atividade e conhecimento da empresa.
O protocolo familiar é um documento que estabelece o modelo de governance dentro da própria família, no que diz respeito ao relacionamento entre os diversos familiares e entre estes e a empresa. O conteúdo de um protocolo familiar é variável de setor para setor e de empresa para empresa, no entanto, existe um conjunto de tópicos que são habitualmente abordados:
O protocolo familiar usualmente congrega disposições de princípios – como os objetivos, valores e missão da empresa e da família, e envolvimento da família com a empresa –, com disposições típicas de acordos parassociais. Neste último domínio, é frequente encontrarem-se cláusulas semelhantes às dos acordos parassociais, como regras relativas à titularidade das participações sociais e limitações quanto à sua transmissão, regras relativas à formação da vontade nos órgãos da sociedade – incluindo identificação de matérias reservadas, maiorias de deliberação ou obrigação de sujeição de certas matérias ao parecer prévio de um órgão familiar –, bem como disposições relativas à designação de órgãos sociais de administração e fiscalização ou estipulações respeitantes à identificação de situações de impasse (deadlock).
Existem dois órgãos que se encontram comummente em estruturas de empresas com cariz familiar: a Assembleia Familiar e o Conselho Familiar.
ASSEMBLEIA FAMILIAR
É o fórum que reúne todos os membros da família e que tem autoridade para definir e alterar o protocolo familiar, bem como para discutir e aprovar alterações relevantes ao plano estratégico e à visão da família para a empresa.
Reúne uma a duas vezes por ano e revê o trabalho efetuado pelo Conselho Familiar.
CONSELHO FAMILIAR
É composto pelos membros da família (não todos) que representam os interesses dos diferentes ramos da família.
Tem como responsabilidade acompanhar e garantir a execução correta do protocolo familiar e de outras determinações efetuadas pela Assembleia Familiar. Tem também habitualmente a responsabilidade de definir e implementar o plano de sucessão dentro da família.